Nem a Bahia consegue ficar seis meses diretos, sem parar, pulando seu carnaval. O rei Assuero, no entanto, séculos antes de Cristo, deu uma festa no seu palácio para os seus príncipes, os servos dos príncipes e todos os homens influentes e poderosos das províncias sobre as quais reinava. Para sua curiosidade, caso queira tentar um cálculo para saber mais ou menos quantos homens estavam na festa, Assuero reinava sobre cento e vinte e sete províncias. Multiplique. E se assuste!
O livro de Ester, no capítulo primeiro e versículo quatro, explica o motivo que levou Assuero a fazer o convite: Para mostrar as riquezas da glória do seu reino e o explendor da sua excelente grandeza, por muitos dias, a saber, cento e oitenta dias. É difícil imaginar uma ostentação tão grande. Um simples jantar na residência de um rico já nos impressiona, é o que basta para deduzirmos a respeito da fartura, do luxo e do conforto que usufrui o sujeito. Imagine cento e oitenta dias de exibicionismo de riquezas e demonstrações de poder através de muito vinho real, servido em vasos de ouro! Impressionante
Um dia de vinho é o suficiente para embebedar. Cinco dias nas festas de Momo, então, nem se fala. E cento e oitenta dias no particular carnaval de Assuero? Como estavam aqueles homens? Maus, muito maus. O cenário era tão caótico que, findo os dias, o rei convidou todo o povo de Susã para ocupar o pátio do jardim do palácio, e deu mais sete dias de festa com muita comida e muito vinho. E as mulheres? Onde estavam durante os sete dias? Bem, aquelas que eram da casa real do rei Assuero, estavam numa festa com a rainha Vasti, sua esposa.
Não perca a conta. Depois de cento e oitenta dias de muita comida e bebida, o rei ainda patrocinou mais sete dias de bebedeira. Qual a conseqüência de tanto álcool? Os versículos dez e onze explicam: E, ao sétimo dia, estando já o coração do rei alegre do vinho, mandou que introduzissem na sua presença a rainha Vasti, com a coroa real, para mostrar aos povos e aos príncipes a sua formosura, porque era formosa a vista.
Ops! O carnaval particular do Momo Assuero estava totalmente fora de controle. Qual marido, em seu juízo perfeito, gostaria de expor e exibir a beleza física de sua mulher para uma multidão de homens totalmente embriagados? A própria Vasti, no versículo doze, indignada com a vontade do marido, enfrentou os direitos caprichosos do rei e negou o pedido: Porém a rainha Vasti recusou vir conforme a palavra do rei.
Precisamos refletir. O que estava acontecendo naqueles seis meses de festança na fortaleza de Susã? Talvez as máscaras que serão usadas nos bailes e nas ruas neste carnaval ajudem a responder. A antiga música carnavalesca afirma: Quanto riso, oh, quanta alegria, mais de mil palhaços no salão! Um momento, mais de mil palhaços? Quem são? De onde vieram? Para se chegar a tantos palhaços, em cada salão, é necessário reunir muita gente. Deve ter auxiliar de escritório, advogado, arquiteto, fotógrafo, carteiro, esportista, motorista, médico, estudante, policial, traficante etc. Embora diferentes, nos dias de carnaval todos ficam iguais. Colocam suas máscaras, cantam as mesmas músicas, bebem a mesma bebida e igualmente se embriagam nos poderes e riquezas de Momo.
Vivemos num Brasil com tanta corrupção e prostituição, que o carnaval com tudo que ele incentiva, expõe e ensina, simplesmente não escandaliza. Boa parte da nossa sociedade o vê apenas como uma festa. Tradição. Folclore. Cultura. Assim, a pergunta se inverte, o comportamento de muitos foliões demonstra que, nesta época, eles colocam ou tiram as máscaras? Afinal, bebe-se muito o ano inteiro, pratica-se sexo de todo tipo o ano inteiro, desobedece-se a pais o ano inteiro, zomba-se da família o ano inteiro. Então chega o carnaval, a festa que dá direito a fantasias que tudo libera, época onde muitos afirmam soltar todos os seus demônios. Mesmo que afirmem só por brincadeira ou simples força de expressão, ainda assim, afirmam.
Em 43 a.C, o poeta romano Ovídio escreveu uma obra por nome Metamorfoses, nela existe a seguinte frase: Quando brincamos, revelamos quem realmente somos. A biografia de Ovídio informa que ele levava uma vida boêmia, liberal, com imoralidades tais que nem o imperador da época, Augusto, tolerou. Se as informações biográficas estão certas, hoje, provavelmente Ovídio estaria entre os foliões dos cinco dias de carnaval e também na carnalidade que se pratica Brasil afora nos trezentos e sessenta e cinco dias do ano. Vivendo neste nosso tempo, muito provavelmente a poesia de Ovídio continuaria dizendo a mesma coisa: Quando brincamos, revelamos quem realmente somos.
Em meio as máscaras e carnaval particular do seu reino, Assuero revelou o seu caráter. Mostrou-se amante dos prazeres carnais, da lascívia, do orgulho, da vaidade. A beleza de sua mulher não era uma benção para ele, era um troféu. Gastar seis meses exibindo a opulência das suas riquezas não bastou. Quando a carne manda, é ela, a carne, que precisa ser exibida. Por isso ele envia a deprimente ordem para sua esposa se apresentar como boi numa exposição. Lamentável.
Máscaras, no final, revelam mais do que escondem. Com a frágil proteção delas, fazemos, falamos e pensamos o que na verdade queríamos sempre fazer, falar e pensar. A festa da carne passa. A quarta de cinzas logo chega. O baile da vida, então, segue. E os Assueros poderosos continuarão nos convidando para tentadores e fartos banquetes. Dançaremos conforme a música? Decididamente, não. Produzamos muito riso e muita alegria como Mardoqueu e Ester o fizeram. - Leia o livro de Ester que você conhecerá os dois que interagiram com o palácio sem se contaminar por ele: Ester e Mardoqueu. - Enfim, vamos produzir muito riso e alegria para os judeus de todas as cento e vinte sete províncias, de todos os países, de todas as tribos. Riso e alegria dAquele que nos amou primeiro, espalhando óleo de alegria nas casas, nos corações de todas as nacionalidades, nos campos, nas plantações, nas montanhas, nas estradas, enfim, nas vidas. E quanto aos salões? Vamos deixá-los vazios, sem máscaras, gente e palhaços.
Paz!
Pr. Edmilson Mendes
Edmilson Ferreira Mendes é teólogo. Atua profissionalmente há mais de 20 anos na área de Propaganda e Marketing. Voluntariamente, exerce o pastorado há mais de dez anos. Além de conferencista e preletor em vários eventos, também é escritor, autor de quatro livros: ''Adolescência Virtual'', ''Por que esta geração não acorda?'', ''Caminhos'' e ''Aliança''.