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A vida em três tempos

A vida em três tempos

Atualizado: Sexta-feira, 10 Fevereiro de 2012 as 8:56

“Que és la vida? Una ilusión, una sombra, una ficción, y el mejor bien és pequeño: que toda la vida es sueño y los sueños... sueños son.”  Calderón de La Barca
 
Como no ocidente racionalizamos mais do que intuímos, temos a tendência de perceber o mundo de forma mais encorpada, por ser este material, e dispensar à vida e à espiritualidade uma consideração diminuta. Concluímos que o mundo é grande e que a vida é curta, pequena. Polarizados nestes extremos, desenvolvemos concepções errôneas. Seria a vida assim tão pequena. Segundo o poeta Gonzaguinha,“há quem fale que a vida da gente é um nada no mundo, é uma gota, é um tempo que não dá um segundo…”

“Um nada no mundo?” Seria o mundo maior do que a vida? Depende. Como sempre, tudo depende do ângulo de onde se observa uma coisa e outra. Se considerada segundo a ótica de Epicuro (314-271 a.C.), filósofo grego antigo que não cria que a alma pudesse resistir o golpe desintegrador da morte, a vida encontraria o seu “fim” com o colapso do corpo. Não haveria nada mais com que se ocupar.

Se por outro lado a vida prossegue, como sustenta o pensamento cristão e o de outras religiões que crêem na imortalidade da alma, então a vida é maior. Todavia, como não temos instrumentos para fazer tal verificação, ficamos diante de uma situação de difícil solução. O mundo é conceito concreto, passível de ser capturado, a vida, por sua vez, escapa-nos para os domínios do subjetivo.

Fato é que, num primeiro instante, a vida como a conhecemos, se dá no mundo, no âmbito concreto do tangível e pode até mesmo parecer insignificante diante da imponência avassaladora da matéria. Engano. Equivoco conceitual. Ainda que a ótica seja estreita e a compreensão obtusa, a vida é maior. O subjetivo sempre entornará para além dos limites da objetividade.

Não deveríamos insistir em fazer contas e submeter tudo à exatidão fria e inflexível de uma operação aritmética. O código da vida jamais será desvendado pelos expedientes da lógica. Poderemos avançar dissecando os componentes da matéria e descrevendo sua dinâmica, mas não passaremos da fronteira onde a bruma misteriosa e permanente paira sobre a bifurcação que separa mundo e vida. O autor do livro de Eclesiastes, o mais filosófico da bíblia hebraica, diz que o espírito (vida) retornará para Deus que o deu, quando o “cântaro (corpo) se quebrar junto à fonte.” A vida não está circunscrita ao corpo. Transcende.

Por Luiz Leite

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