Um pastor de Goiânia foi denunciado ao Ministério Público Federal, após fazer algo que é considerado muito comum a evangelistas e missionários: batizar um grupo de indígenas xavantes no estado do Mato Grosso.
A denúncia foi feita pela pedagoga Juliani Caldeira, que protocolou uma representação no MPF no dia 28 de agosto, após ver imagens do batismo, que ocorreu na terra indígena de Areões (MT), divulgadas pelo pastor em seu perfil das redes sociais. O procedimento ainda não está tramitando.
Em sua denúncia, Caldeira questionou a presença da vereadora Aninha Araújo e dos missionários na aldeia, solicitando que o caso seja investigado.
"Sendo o Estado Laico e sendo a vereadora representante do povo no seu mandato, teria ela o consentimento para entrar em aldeias, levando a sua cultura para um grupo que já possui a sua própria?", questionou Juliani, em parte do documento protocolado no Ministério Público.
O batismo também foi duramente criticado pela página de esquerda 'TODAS Fridas', que acusou Pastor Isac de "impor a fé cristã" sobre os indígenas batizados e promover um "genocídio cultural".
"Desde 1500 o homem branco promovendo um genocídio Cultural com as populações indígenas. Isso não é bonito, indígenas não precisam ser batizados, convertidos ou catequizados, deixem que eles vivam a sua cultura, as suas religiões", disse a página, ao compartilhar a publicação feita pelo próprio pastor.
Esclarecimentos
Apesar das acusações contra Isac, de que ele estaria "ferindo" a cultura daqueles indígenas, o pastor explicou que a celebração do batismo não consistiu em forçar ninguém a fazer nada e que foram os próprios índios que pediram pela cerimônia.
"Foi um dia de festa. A gente foi todo mundo a pé, e eles cantavam, foi muito bonito, porque eles aguardavam com muita expectativa este batismo. Já fazia quatro meses que eles estavam nos pedindo. Como não conhecíamos as regras indígenas, resolvemos aguardar, tanto para eles terem certeza desta decisão, quanto para nós, que seríamos os responsáveis por esta transição", disse o pastor, em depoimento ao G1.
O batismo ocorreu no último dia 21 de agosto, no Rio Borecai, em uma comunidade xavante que fica no município de Nova Nazaré, localizado à região nordeste do Mato Grosso.
Isac contou que seu contato inicial com os indígenas não foi nada programado. Tudo começou depois que seu pai, que vive em Água Boa, município vizinho, deu ao cacique - que já era convertido ao cristianismo - daquela tribo xavante.
“Os índios andam muito naquela região e ficam transitando entre a aldeia e cidade. Meu pai deu carona para alguns deles e, coincidentemente, era o cacique da tribo, que já era cristão. A partir desta carona surgiu uma grande amizade, não só o cacique, mas outros índios frequentam a casa do meu pai e sempre pediram para que fosse feito este batismo”, contou.
Isac lidera a Igreja Tempo de Semear em Goiânia e soube por meio de seu pai que os índios estavam querendo ser batizados.
"Meu pai ficou meio inseguro em fazer o batismo porque não conhecia as regras. Nós pesquisamos e vimos que não tinha nada que nos impedisse, já que tínhamos o aval do cacique e eles já eram cristãos, não era uma imposição nossa. Eu não sei de que forma eles conheceram o mundo cristão, mas estavam entusiasmados em ser batizados", explicou.
Pastor Isac Santos (ao meio) com líderes indígenas de Areões. (Foto: Facebook)
Preconceito
Segundo o pastor Isac, as críticas feitas ao batismo revelam a visão preconceituosa que muitos ainda têm sobre a cultura indígena, acreditando que eles não podem optar por seguir uma religião diferente da que eles foram ensinados por seus ancestrais.
"A maioria das pessoas tem uma visão deturpada do índio. O índio hoje tem celular, veste roupa, convive na cidade e, muitas vezes, como neste caso, tem a mesma fé que a gente. Nós demos a eles o que eles pediram, eles não foram obrigados. Tanto que, em uma aldeia de quase 200 índios, só 38 quiseram ser batizados", afirmou.
O uso de roupas pelos índios também foi um ponto de crítica rebatido pelo pastor. Isac explicou que o uso das roupas também foi uma escolha dos próprios índios batizados.
"Nas fotos é possível ver as índias de sutiã, e a gente não tem nada a ver com isso, até porque eu não teria coragem de levar sutiã. É um hábito deles usarem roupas íntimas. Eles foram à cidade, eles compraram as roupas para este momento especial", contou.
Segundo o comentário feito pela página de esquerda que criticou o batismo, "eles [índios] não parecem nada felizes" na foto. Porém Isac explicou que tirar fotos ainda não é algo comum para muitos da aldeia.
"Quanto à expressão das índias, muitos disseram que elas estavam tristes, mas não. Na verdade é que havia um certo constrangimento em tirar foto, não em batizar", destacou.
Ajuda
Pastor Isac ainda lembrou que o maior objetivo da ação de missionários na comunidade indígena é ajudá-los a terem acesso a saúde, educação, e itens pessoais. Ele afirmou que o cacique até o convidou a construir uma igreja na aldeia, mas não atendeu a este pedido.
"Tirando a questão religiosa, porque sei que a maioria das pessoas discorda, exatamente por não conhecer, por não ter acesso, as tribos e estas pessoas, precisam ser assistidas de uma forma social. Para mim foi muito emocionante em ver que é um povo que muitas vezes não é assistido de uma forma básica, e a gente tem a oportunidade de, através do nosso trabalho, ajudar, somar com eles", afirmou.