
Entre janeiro e fevereiro, pelo menos 19 cristãos foram presos em diversas ocasiões na cidade sudanesa de Madani, dizem fontes locais. Elas relatam que sete deles foram detidos em 21 de janeiro por agentes de segurança ligados às Forças Armadas do Sudão (SAF).
O grupo estava viajando de Barakat para Madani, capital do estado de Al Jazirah, e foi acusado de apoiar as Forças de Apoio Rápido (RSF), uma organização paramilitar em conflito com as SAF desde abril de 2023.
Membros de diversas igrejas vinculadas ao Conselho de Igrejas do Sudão estavam a caminho de uma reunião de oração de ação de graças organizada pela Comissão Inter-Eclesiástica.
A cidade de Madani está localizada a 136 quilômetros a sudeste da capital, Cartum.
Cristãos negam acusações
O advogado Shinbago Mugaddam confirmou as prisões, relatando que os cristãos foram inicialmente detidos na Cela Militar Conjunta, em Madani. Lá, eles enfrentaram interrogatórios intensos por uma semana, antes de serem transferidos para a Prisão de Madani.
Ele mencionou os nomes dos cristãos presos, e todos negaram qualquer vínculo com a RSF.
Líderes da Igreja no Sudão afirmaram que não há provas de qualquer vínculo entre os cristãos presos e a RSF. Eles exigiram a libertação imediata dos detidos.
"Um grupo de líderes religiosos da região pediu, por meio de uma carta das igrejas locais, que os cristãos fossem libertados, já que não são apoiadores da RSF. No entanto, os cristãos continuam presos", disse Mugaddam ao Morning Star News.
Em Wad Rawah, a aproximadamente 94 quilômetros de Madani, 12 cristãos estão detidos desde janeiro, acusados de serem apoiadores da RSF. Segundo Mugaddam, o paradeiro deles permanece desconhecido.
Direitos cristãos
Organizações de direitos cristãos classificaram as prisões como parte de um esforço sistemático para erradicar o Cristianismo no Sudão.
"Isso é uma perseguição sistemática aos cristãos, que são presos sem serem levados a um tribunal para obter justiça", afirmou Mugaddam.
Em maio, o governo militar do Sudão promulgou uma lei que restaura os amplos poderes e imunidades dos agentes de inteligência, previamente retirados após a queda do presidente Omar al-Bashir em abril de 2019.
A Emenda de 2024 à Lei do Serviço Geral de Inteligência (GIS) concede autoridade para convocar e interrogar indivíduos, realizar vigilância e buscas, deter suspeitos e apreender bens, conforme relatado pelo Sudan War Monitor.
A emenda garantiu ampla imunidade, protegendo os agentes contra processos criminais ou civis sem o consentimento do chefe do GIS. Em situações que envolvem pena de morte, conferiu ao diretor o poder de estabelecer um tribunal especial.
"Qualquer ato cometido por qualquer membro da agência de boa fé durante ou em razão do desempenho de suas funções, ou do cumprimento de qualquer dever que lhe tenha sido imposto, ou de qualquer ato realizado por ele sob qualquer autoridade autorizada ou concedida a ele por esta lei, não será considerado um crime", afirma o Artigo 52 da lei, de acordo com o Sudan War Monitor.
5º na Lista Mundial da Perseguição
Na Lista Mundial de Observação 2025 da Portas Abertas, o Sudão ocupa a 5ª posição entre os 50 países mais desafiadores para os cristãos, subindo da 8ª posição registrada no ano anterior.
As condições no Sudão se deterioraram com a intensificação da guerra civil iniciada em abril de 2023. Segundo o relatório da PA, houve um aumento no número de cristãos mortos, abusados sexualmente e no ataque a casas e empresas cristãs.
"Cristãos de todas as origens estão presos no caos, incapazes de fugir. Igrejas são bombardeadas, saqueadas e ocupadas pelas partes em conflito", afirmou o relatório.
Tanto a RSF quanto a SAF são forças islâmicas que atacaram cristãos deslocados sob acusações de apoiar os combatentes uma da outra.
O conflito entre a RSF e a SAF, que governavam em conjunto o Sudão após o golpe de outubro de 2021, espalhou terror entre civis em Cartum e outras regiões. Segundo o ACNUR, o confronto já resultou na morte de dezenas de milhares e no deslocamento de mais de 12,9 milhões de pessoas dentro e fora do país.
O general Abdelfattah al-Burhan, das SAF, e seu vice na época, Mohamed Hamdan Dagalo, líder das RSF, estavam no poder quando, em março de 2023, partidos civis chegaram a um acordo sobre uma estrutura para restabelecer a transição democrática no mês seguinte. No entanto, divergências relacionadas à organização militar impediram a aprovação final.
Burhan propôs integrar a RSF, uma força paramilitar originada das milícias Janjaweed que apoiaram o ex-líder Al-Bashir na luta contra os rebeldes, ao exército regular em um prazo de dois anos. Já Dagolo insistiu que a integração deveria levar, no mínimo, 10 anos.
Liberdade religiosa
Com raízes islâmicas, ambos os líderes militares buscam projetar uma imagem para a comunidade internacional de defensores da democracia e da liberdade religiosa.
Em 2021, o Sudão deixou o top 10 da Lista Mundial d Perseguição pela primeira vez em seis anos, alcançando a 13ª posição.Após avanços na liberdade religiosa no Sudão depois da queda de Bashir em 2019, a perseguição estatal ressurgiu com o golpe militar de 2021. O governo de transição havia revogado disposições da Sharia, incluindo leis de apostasia. Ele proibiu a rotulagem de qualquer grupo religioso como "infiel" e, assim, efetivamente rescindiu as leis de apostasia que tornavam o abandono do islamismo punível com a morte.
Após o golpe de 25 de outubro de 2021, os cristãos no Sudão passaram a temer o ressurgimento dos aspectos mais repressivos e rigorosos da lei islâmica.
Em 2019, o Departamento de Estado dos EUA retirou o Sudão da lista de Países de Preocupação Particular (CPC), onde figuravam países envolvidos ou coniventes com “violações sistemáticas, contínuas e flagrantes da liberdade religiosa”, transferindo-o para uma lista de observação. Antes disso, o Sudão foi classificado como CPC de 1999 a 2018.
Em dezembro de 2020, o Departamento de Estado dos EUA retirou o Sudão da sua Lista de Observação Especial.
A população cristã do Sudão é estimada em 2 milhões, ou 4,5% da população total de mais de 43 milhões.