A Justiça do Espírito Santo autorizou que uma criança de 10 anos seja registrada com três pais e uma mãe. A decisão foi tomada em 21 de janeiro passado e reconhece a “dupla paternidade socioafetiva de um casal homoafetivo” que cuida da criança desde que ela nasceu.
A guarda da criança será compartilhada legalmente entre os pais biológicos e os pais socioafetivos.
A advogada Ana Paula Morbeck, que representa a família, destacou que a criança já se identificava dessa forma e que a decisão visa garantir os direitos da criança em situações do dia a dia, como consultas médicas e viagens.
Segundo ela, com os nomes incluídos na certidão, a família se resguardaria de problemas burocráticos. Além disso, todos os envolvidos queriam garantir os direitos da criança.
"Era um desejo de colocar na certidão para regularizar e dar garantia jurídica para a criança. E para ela isso é excelente. A regularização é mais importante para a criança do que para os pais e a vida vinha fazendo com que eles precisassem de comprovações dessa filiação", comentou.
‘Casal homossexual’
A advogada também explicou a relação entre os quatro pais:
"Um dos tios é irmão do pai biológico da criança e assim que ele [a criança] nasceu, eles moravam em um conjugado em que em um andar estava o casal homossexual e os pais biológicos. Depois os pais biológicos se mudaram, e o menino passou a morar com os pais socioafetivos, porque os pais biológicos precisavam passar um tempo fora. A convivência e a relação deles foi construída dessa forma", explicou a advogada.
Em 2022, a ação foi negada na primeira instância, mas os pais entraram com um pedido de apelação e o caso foi para o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES).
A decisão favorável foi unânime, com o voto de três desembargadores, e os nomes devem ser inseridos na certidão em até 30 dias úteis.
O que diz a lei
Em 2019, o Supremo Tribunal Federal determinou que a paternidade socioafetiva não impede, necessariamente, o reconhecimento do vínculo biológico no registro.
Com essa decisão, foi estabelecida a possibilidade de reconhecer a multiparentalidade, além de afirmar que a paternidade socioafetiva é um fato jurídico, ou seja, um acontecimento que depende da vontade humana e gera efeitos jurídicos.
O relator do caso, Ministro Luís Roberto Barroso, destacou que o Direito de Família não deve ser marcado por rigidez ou formalismo excessivo, mas sim refletir a vida real, que envolve diversas formas de manifestação familiar.
“O Direito de Família deve refletir a vida real e as suas variadas formas de manifestação, sem hierarquizar modelos de família”, disse Barroso, à época da decisão.
Preocupação com crianças
Expressando sua opinião sobre a adoção de crianças por homossexuais, em entrevista de 2014, a psicóloga Marisa Lobo afirmou suas preocupações com menores envolvidos nesse tipo de convivência.
"Não acredito, como psicóloga, que a criança tenha suporte emocional para entender o que se passa com ela e as diferenças em relação às outras famílias tradicionais (ainda que com pais separados). Falo apenas como profissional, pensando no bem-estar dessa criança. Não podemos, se somos éticos e seres humanos sensatos, negligenciar essa verdade. Por mais liberais e relativistas que a sociedade seja, temos que admitir que a criança PODE ficar confusa e entrar em conflitos psíquicos com a definição dos papéis sociais, sexual e com sua própria identificação”.
A profissional destacou ainda:
“Outra questão a ser abordada é que o ser humano é muito tendencioso; os pais podem induzir a criança a comportamentos homossexuais ou bissexuais sem que necessariamente a criança seja, por estímulo oferecido, causando assim um grande sofrimento em sua alma no futuro, o que pode desencadear transtornos emocionais irreversíveis e até mesmo sexuais.”
E questionou: “Isso acontece com crianças adotadas por famílias tradicionais, então, por que não ocorreria com casais gays?"