
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, com repercussão geral, que pacientes têm o direito de recusar transfusões de sangue por motivos religiosos.
Isso significa que, após o julgamento, juízes e tribunais devem aplicar o mesmo entendimento em casos semelhantes.
A decisão foi tomada após o Conselho Federal de Medicina (CFM) recorrer contra esse direito, mas a Corte manteve o entendimento que garante a autonomia individual e a liberdade de crença.
O julgamento ocorre no plenário virtual do STF e a maioria dos votos foi consolidada neste domingo (17/8).
Os ministros acompanharam o voto do relator, Gilmar Mendes, que destacou o amparo constitucional à liberdade de consciência e de crença – direito que, segundo ele, inclui a possibilidade de recusa a tratamentos médicos por convicções religiosas.
O magistrado ressaltou que a decisão que reconhece às Testemunhas de Jeová o direito de recusar procedimentos com transfusão de sangue é coerente com os princípios constitucionais.
'Vontade deve ser expressa'
Para ele, não compete ao Estado impor a um paciente adulto e plenamente capaz a realização de uma transfusão contra sua vontade – mesmo diante da possibilidade de salvar sua vida.
“Vale dizer, em circunstâncias nas quais haja iminente risco à vida do paciente e não haja tempo para encaminhamento a outro profissional, subsiste a obrigação médica, ainda que por quaisquer razões o agente de saúde não concorde com a legítima opção feita pelo paciente, de zelar pela vida do paciente, com emprego de todos os métodos disponíveis e compatíveis com a crença professada pelo paciente”, escreveu o ministro nos embargos de declaração.
Ele acrescentou: “Em tal cenário, prevalece o dever de cuidado à vida do paciente – sempre respeitada a sua manifestação de vontade –, sendo, inclusive, passível de responsabilização administrativa, civil e criminal o abandono ou a negativa de atendimento por parte do médico.”
O relator enfatizou que a recusa ao tratamento só tem validade quando expressamente manifestada pelo paciente – seja de forma oral, escrita ou por meio de diretivas antecipadas de vontade, como o testamento vital.
Na ausência dessa manifestação, cabe ao profissional de saúde adotar todas as providências necessárias para resguardar a vida e a integridade do paciente.
Na ausência de manifestação expressa do paciente, cabe ao profissional de saúde tomar todas as providências cabíveis para proteger sua vida e promover sua recuperação.
O voto de Gilmar foi acompanhado por Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, André Mendonça e Dias Toffoli. Os demais ministros têm até o fim desta segunda-feira (18/8) para registrar os votos.
Decisão mantida
O recurso protocolado pelo CFM se fundamenta na decisão proferida pelo STF em setembro do ano anterior, quando os ministros reconheceram o direito das Testemunhas de Jeová de recusarem transfusões de sangue por razões religiosas, inclusive em procedimentos realizados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Ao analisar dois recursos com repercussão geral, os ministros também entenderam que o Estado tem o dever de custear tratamentos alternativos.
A decisão leva em conta que as Testemunhas de Jeová, por convicções religiosas, recusam procedimentos que envolvam transfusão de sangue.
A tese decidida pelo plenário diz:
“Testemunhas de Jeová, quando maiores e capazes, têm o direito de recusar procedimento médico que envolva transfusão de sangue, com base na autonomia individual e na liberdade religiosa. Como consequência, em respeito ao direito à vida e à saúde, fazem jus aos procedimentos alternativos disponíveis no Sistema Único de Saúde – SUS, podendo, se necessário, recorrer a tratamento fora de seu domicílio”.