Crianças com pressa de crescer, adultos com preguiça de cuidar

A “adultização” infantil não é novidade. O que é novo é a velocidade e a escala com que ela acontece.

fonte: Guiame, Alisson Magalhães

Atualizado: Quarta-feira, 13 Agosto de 2025 as 2:11

(Foto: Pixabay)
(Foto: Pixabay)

Semana passada, as redes sociais ferveram com o caso do influenciador Felca e a polêmica envolvendo crianças expostas a conteúdo adulto. Muita gritaria, muito dedo apontado, muito “isso é um absurdo” nas timelines. Mas, como sempre, o barulho vai diminuindo, o algoritmo entrega outra polêmica e seguimos a vida… até o próximo choque de indignação.

Só que esse caso é mais do que uma discussão sobre um influenciador. É um espelho — daqueles que a gente evita olhar — do que estamos fazendo com a infância. E a resposta não é bonita.

A “adultização” infantil não é novidade. O que é novo é a velocidade e a escala com que ela acontece. A pressão para que crianças se comportem, se vistam e até pensem como adultos vem sendo turbinada pelo motor das redes sociais. Vídeos de meninas dançando coreografias sensuais no TikTok, meninos repetindo falas carregadas de conotação sexual, crianças imitando youtubers que falam de temas que nem deveriam entender. Tudo embalado em luz, cor e música viciante — pronto para o consumo rápido e massivo.

E aí entra a parte incômoda: não é só culpa das “plataformas” ou dos “influencers”. A responsabilidade começa dentro de casa. São pais e mães que colocam um celular na mão da criança para “ganhar um pouco de paz”, que deixam o algoritmo ser babá, que filmam e postam os próprios filhos para arrancar risos e curtidas, sem pensar no que isso significa a longo prazo. É a preguiça de educar, a covardia de dizer “não” e a ingenuidade de achar que “com meu filho não acontece” que alimentam esse ciclo.

O resultado? Uma geração que pula etapas essenciais do desenvolvimento. Crianças que deveriam estar descobrindo o mundo em segurança, aprendendo a lidar com frustrações e construindo autoestima, acabam gastando a infância treinando poses para um feed. No lugar da imaginação, recebem filtros. No lugar da curiosidade, recebem algoritmos que entregam mais do mesmo. No lugar de referências sólidas, recebem um desfile de vidas irreais para imitar.

E não é só psicológico — é cultural. A infância, que deveria ser o espaço do lúdico e do aprendizado gradual, está sendo trocada por um treino precoce para o mercado da atenção. E isso tem um preço: erosão de valores, banalização de temas sérios e, no fim das contas, adultos emocionalmente frágeis, incapazes de lidar com a vida sem buscar aprovação em “likes”.

A verdade é que não existe plataforma capaz de proteger uma criança se os próprios pais não fizerem o papel de guardiões. Não existe lei que substitua a presença. E não existe filtro mais seguro do que a orientação firme de quem cria.

Proteger a infância não é moralismo, é investimento no futuro. Regular o que chega até elas não é censura, é garantir o direito básico de viver a fase mais importante da vida no tempo certo. E educar para o uso consciente da tecnologia não é opção — é obrigação.

Se a infância é vendida por curtidas, prepare-se para comprar um futuro de adultos quebrados.

Porque, no fim, enquanto a gente brinca de moralista nas redes, as redes estão moldando a próxima geração — e não é do jeito que você imagina.

 

Alisson Magalhães (@pralissonmagalhaes) é Ministro Ordenado na Igreja do Nazareno, formado em Teologia pela FNB/Unicamp, professor de Teologia em cadeiras teológicas, pastorais e na área de música e adoração. Autor do livro Cristianismo 4.0 – Desafios para a comunicação cristã no século XXI, é publicitário, jornalista, Consultor e Especialista em Comunicação Pública, Marketing Político e Eleitoral. Atualmente serve com sua esposa, Elaine, na Serra Catarinense, onde também atua como Chefe de Gabinete no município de Palmeira/SC.

* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

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