Quem respeita a dor alheia exerce a misericórdia

O que se ganha em destilar tanto veneno através de julgamentos levianos sem qualquer fundamentação ou prova?

fonte: Guiame, Edmilson Ferreira Mendes

Atualizado: Quinta-feira, 20 Fevereiro de 2020 as 1:25

(Foto: Pinterest)
(Foto: Pinterest)

Semana passada caminhei uns três quilômetros dentro de um cemitério de Campinas. Acompanhava um sepultamento. O cemitério em questão é daqueles com túmulos de mármore, cruzes, esculturas, mausoléus. Durante a caminhada, me chamou a atenção uma frase gravada num dos muitos túmulos: “A dor confortada pela fé.” Existem perdas que somente a fé, através do Espírito, pode trazer consolo e conformação.

O funcionário daquele cemitério, que fechou o túmulo com uma pedra de mármore e cimento, não deve ter sido bem orientado e treinado quanto ao respeito, pois enquanto fazia seu trabalho, diante de dezenas de pessoas, entre familiares e amigos, todos contritos, misturando choro com silêncio reverente, o homem ia soltando suas reclamações audíveis. Para ele tudo estava errado, a pedra de mármore fora de medida, a boca do túmulo torta, o cimento de baixa qualidade, enfim, uma postura totalmente sem nexo para o momento.

Lembro de ouvir enquanto caminhávamos para ir embora, algumas reclamações e protestos de indignação por parte dos que testemunharam as reclamações do homem. “Que falta de respeito...”, “Pra ele esse tipo de trabalho é corriqueiro, mas poxa vida, deveria respeitar o momento e o sentimento de quem estava ali sofrendo a perda...” Eu, particularmente, nunca tinha presenciado uma cena tão constrangedora num sepultamento. No mínimo, foi bem desconfortável.

Infelizmente, o que vi no cemitério, é mais comum do que se possa imaginar. Muita gente não respeita a dor alheia. Rapidamente e com toda facilidade já vão emitindo uma opinião, e via de regra, desqualificando e diminuindo a importância dos sentimentos. Para piorar, também apontam soluções bem simplistas, do tipo “Ah, se fosse comigo, eu faria isso e isso, assim e assim, e pronto, resolveria tudo e não ficaria sofrendo desse jeito...”, “Ah, isso não é nada, fulano tá exagerando, eu sim sei o que é sofrer...”, “Essa aí tá sofrendo a toa, eu conheço uma pessoa que, essa sim, sofre de verdade, agora isso que essa pessoa tá reclamando não tem nada a ver...”

Posturas semelhantes as que ilustrei acima acontecem mais do que se possa imaginar. O triste é quando chegam nos ouvidos das pessoas que foram o objeto da crítica. Machuca. Decepciona. Entristece. Humilha. Destrói. E para quê? O que se ganha em destilar tanto veneno através de julgamentos levianos sem qualquer fundamentação ou prova?

Faz tempo que tenho repetido o seguinte pensamento: dor é um sentimento que não deve ser comparado, antes, precisa ser respeitado. Provérbios 14:10 deixa este conceito extremamente claro: “Só você conhece a sua própria amargura e você também não pode repartir a sua alegria com estranhos.” Entendeu? Ninguém será capaz de definir com exatidão as amarguras que somente eu sinto no meu coração, assim como as minhas mais espetaculares alegrias eu não vou conseguir fazer com que os outros sintam na mesma dimensão, no máximo, poderei motivar os outros a também tentarem experienciar algum tipo de alegria, mas nunca exatamente aquela que pulsa dentro de mim.

William Shakespeare, em sua poesia, definiu numa sentença a urgente necessidade de se respeitar a dor alheia: “Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente.” E nunca se esqueça, por trás de uma dor sempre existe uma história que precisa ser ouvida, compreendida e respeitada. Paz!

Edmilson Ferreira Mendes é teólogo. Atua profissionalmente há mais de 20 anos na área de Propaganda e Marketing. Voluntariamente, exerce o pastorado há mais de dez anos. Além de conferencista e preletor em vários eventos, também é escritor, autor de quatro livros: '"Adolescência Virtual", "Por que esta geração não acorda?", "Caminhos" e "Aliança".

* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

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