Apesar do esforço, Coreia do Norte não consegue erradicar igrejas cristãs

Relatos de desertores e ativistas de direitos humanos indicam que pequenos grupos e indivíduos continuam mantendo sua fé em segredo.

fonte: Guiame, com informações do DW e DailyNK

Atualizado: Terça-feira, 2 Dezembro de 2025 as 11:28

Cristãos na Coreia do Norte seguem Jesus em segredo. (Foto ilustrativa: Portas Abertas)
Cristãos na Coreia do Norte seguem Jesus em segredo. (Foto ilustrativa: Portas Abertas)

O regime da Coreia do Norte, liderado por Kim Jong-un, intensificou a repressão e afirma ter “praticamente exterminado” as igrejas clandestinas no país.

Segundo informações divulgadas pela mídia dissidente DailyNK, com sede em Seul, as autoridades têm comemorado o controle absoluto sobre instituições religiosas.

Mas relatos de desertores e ativistas de direitos humanos indicam que pequenos grupos e indivíduos continuam mantendo sua fé em segredo.

“Eles têm sido alvo do regime, e muitas pessoas foram detidas, mas sabemos que ainda existem cristãos fervorosos que praticam sua fé em pequenos grupos ou individualmente”, disse Song Young-Chae, ativista da Coalizão Mundial para Acabar com o Genocídio na Coreia do Norte.

Segundo Young-Chae, suas constatações se baseiam em depoimentos de pessoas que cruzaram neste ano a fronteira do Norte para o Sul.

Alguns exilados relatam que cultos ocorridos há décadas continuam vivos – escondidos em casas ou reunidos às escondidas, com muito medo de denúncias.

Focos de resistência religiosa

Não há dúvida de que os focos de resistência continuam sendo alvo de perseguição. Embora o Artigo 68 da Constituição norte-coreana garanta formalmente a liberdade religiosa, na prática o regime vigia e reprime qualquer atividade relacionadas às igrejas, que considera uma ameaça ao seu poder.

Crianças são doutrinadas desde cedo a venerar a família governante – algo que o Estado apresenta como “culto nacional” – e o Cristianismo é visto como uma influência estrangeira perigosa.

Os cristãos são alvo de repressão por serem associados a influências ocidentais.

‘Classe hostil’

Indivíduos religiosos são classificados como pertencentes à “classe hostil”, o que implica discriminação na distribuição de funções, acesso à educação, escolha de moradia e outros aspectos da vida social.

A repressão religiosa se intensificou após a promulgação, em setembro de 2021, da Lei de Garantia da Educação da Juventude, que passou a incluir práticas religiosas na lista de atividades totalmente proibidas para jovens.

“Não existe um departamento específico dedicado à repressão religiosa, mas os departamentos de contraespionagem classificam a atividade religiosa como um ‘crime antiestatal’ e a investigam por conta própria", afirmou uma fonte na Coreia do Norte citada pelo DailyNK.

“Agências de segurança provinciais, municipais e distritais realizam repressões autônomas e, em particular, nas regiões de fronteira, por onde frequentemente entram informações externas.”

Punições severas

Organizações internacionais de direitos humanos, como Christian Solidarity Worldwide, e comissões de liberdade religiosa já classificam a Coreia do Norte como um dos países com maior repressão religiosa no mundo.

Em seu relatório anual, a comissão descreve a Coreia do Norte como “um dos países que mais violam a liberdade religiosa no mundo em 2024” e afirma que o regime de Pyongyang “encara a religião como uma ameaça existencial ao Estado”, considerando os cristãos “colaboradores das forças imperialistas e inimigos da nação e da revolução”.

Cristãos tentam escapar pela vigiada fronteira com a Coreia do Sul. (Foto ilustrativa: Portas Abertas)

Qualquer pessoa encontrada com uma Bíblia, em oração ou participando de práticas religiosas não autorizadas pode sofrer punições severas.

“Simplesmente possuir uma Bíblia, interagir com missionários cristãos ou participar de cultos religiosos pode levar a punições severas, incluindo tortura, trabalhos forçados, prisão e execução”, diz o relatório.

País ateu

No país oficialmente ateu existem algumas poucas igrejas autorizadas, como a Igreja da Santíssima Trindade e a Catedral de Changchung, ambas em Pyongyang.

Segundo a Portas Abertas, especialistas afirmam que essas instituições funcionam apenas como fachada: mostradas a visitantes estrangeiros para dar uma aparência de liberdade religiosa, mas sem permitir culto genuíno ou comunitário entre norte-coreanos.

Para milhares de cristãos que não aceitam viver sem exercer sua fé, restam os riscos de reuniões secretas, vida clandestina e medo constante. Mas também, para muitos, a convicção de que estão participando de uma resistência espiritual secreta.

Desafio silencioso

Eunju Kim, que fugiu da Coreia do Norte com a mãe na década de 1990, hoje atua como ativista na organização HanVoice, dedicada ao reassentamento de refugiados em Seul.

Segundo ela, “há uma igreja em Pyongyang, mas sua existência serve apenas para sustentar a falsa alegação de que as pessoas têm liberdade para praticar sua religião”.

Ainda assim, há quem escolha desafiar o regime de forma silenciosa. “Pessoas que tiveram contato com a igreja e o cristianismo na China antes de serem repatriadas para a Coreia do Norte podem manter sua fé e crença em Deus, e algumas continuam realizando seus cultos. Fazem isso em segredo, sem que ninguém ao redor perceba”, afirma Kim.

Em 2024, três missionários sul-coreanos capturados na Coreia do Norte permaneciam presos após mais de uma década atrás das grades, segundo a comissão dos EUA.

 

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