A cidade etíope de Lalibela, patrimônio da humanidade, caiu nas mãos de rebeldes do Tigré e a ONU teme que o local turístico e cristão, que remonta a 900 anos, esteja correndo perigo.
O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, pediu nesta terça-feira (10) a todos os etíopes que sirvam nas forças armadas ou milícias para o confronto com os separatistas invasores.
O Patrimônio Mundial da Unesco conta com os maiores tesouros culturais e religiosos, não só da Etiópia, mas da África e da cristandade. No local, há antigas igrejas escavadas nas rochas de Lalibela, abaixo do nível do solo, com uma variedade de estilos.
Algumas foram cinzeladas na face da rocha, enquanto outras permanecem como blocos isolados, como a igreja de São Jorge, construída em forma de cruz. Um complexo e extenso sistema de valas de drenagem, túneis e passagens subterrâneas conecta as estruturas.
As igrejas espetaculares foram esculpidas por dentro e por fora de uma única rocha há cerca de 900 anos. (Foto: Carl de Souza/AFP/Getty Images)
A cidade de Lalibela fica em Amhara, norte da Etiópia, onde se encontram igrejas monolíticas. Elas foram esculpidas em rocha viva por ordem do rei de Lalibela, no século 12 da era cristã. O local oferece um vislumbre da civilização medieval da Etiópia.
Registros históricos
Em 2016, o fotógrafo Tariq Zaidi seguiu a rota dos peregrinos em Lalibela e arredores. Ele lembrou a majestade da arquitetura e da beleza da região, mas principalmente de seu povo.
“Eles são muito pobres, muito humildes”, disse Zaidi à CNN na época. “Eles vêm para a peregrinação, esperançosamente, uma vez na vida, se puderem pagar. Muitas pessoas caminharam pelo país, quase sem nada com eles”, relatou.
Zaidi descreveu a comunidade local saindo para ajudar os peregrinos, alimentando-os e até ajudando a lavar seus pés. “É muito bonito, poético e até romântico, de uma forma como poucas coisas em nosso mundo são”, disse.
Tradição cristã e direitos internacionais
Na cultura antiga, os cristãos tinham por tradição visitar, ao menos uma vez na vida, a cidade de Jerusalém, como hoje os muçulmanos fazem com a cidade de Meca, que foi transformada em centro religioso.
Como Jerusalém estava dominada pelos árabes, os cristãos não podiam exercer essa tradição. Assim, enquanto os católicos europeus se voltavam para Roma, Lalibela decidiu construir uma réplica de Jerusalém em seu reino. Trata-se de uma das cidades mais sagradas para a Igreja Ortodoxa Etíope, junto com Axum, que fica na região Tigré.
A Unesco declarou Lalibela Patrimônio Mundial em 1978. Cinco anos atrás, a agência internacional ergueu coberturas protetoras para proteger quatro das igrejas, preservando assim a integridade das estruturas. (Foto: Carl de Souza/AFP/Getty Images)
Em comunicado divulgado na sexta-feira (06), a Unesco pediu “o respeito a todas as obrigações relevantes sob o direito internacional para garantir a proteção do patrimônio mundial”.
A preocupação da Unesco é que o local seja exposto a danos ou qualquer tentativa de saque ou pilhagem de bens culturais que estão na região onde há conflitos. “Lalibela é um lugar de peregrinação, devoção e paz; não deve ser um lugar para instigar a violência e o conflito”, declarou a Unesco.
História e arquitetura incomum de Lalibela
As 11 igrejas em cavernas monolíticas medievais da “Nova Jerusalém” do século 13 estão numa região montanhosa no norte da Etiópia. Elas entraram para a Lista do Patrimônio Mundial em 1978 e estão a cerca de 645 quilômetros da capital Adis Abeba.
As estruturas foram encomendadas pelo Rei Lalibela da Dinastia Zagwe, que governou grande parte do país no século 12. É quase impossível de ver à distância, então o feito impressionante proporcionou um espaço seguro para os cristãos se esconderem da expansão muçulmana vinda do norte, naquela época.
Mas, o cristianismo que exisitu há muitos séculos na Etiópia foi fortemente combatido pelo islamismo e, hoje em dia, os cristãos são perseguidos por lá. Em terras etíopes prevalece somente a Igreja Ortodoxa, que é protegida pelo governo. O islamismo radical passou a ser uma ameaça aos cristãos protestantes.
No país africano também existe uma paranoia ditatorial, principalmente em áreas de maioria muçulmana. As atividades evangélicas são combatidas com violência.