"Nunca se ouviu e produziu tanta música". A declaração foi dada pelo diretor e CEO da Sony Music Gospel, Maurício Soares, em um verdadeiro tom de celebração, pois a gravadora tem acompanhado o ritmo intenso que o mercado fonográfico vivencia em tempos de plataformas digitais e da notável diminuição da produção e venda dos CDs — tão consumido nas lojas até pouco tempo atrás.
Em uma entrevista exclusiva ao Guiame, o publicitário e jornalista falou abertamente sobre como os cantores podem alcançar êxito em uma época na qual não basta mais simplesmente "divulgar a sua própria música" e exige um trabalho diário do artista, buscando cada vez mais interatividade e proximidade com aqueles que consomem música nas mais diversas plataformas.
O diretor da Sony Music também destacou que "repetir o mantra de que o mercado gospel é atrasado" só atrapalha o avanço e impede a música cristã de se colocar junto às inovações.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Portal Guiame: Em um de seus artigos recentes, você falou sobre a divulgação feita por cantores com suas músicas e o que pode dar bons resultados. Apesar das recentes mudanças nas estratégias de divulgação, a exposição nas redes sociais ainda se faz necessária?
Maurício Soares: Ainda, não, mas principalmente! As redes sociais são hoje uma importante forma de divulgação e são um reflexo das muitas mudanças que vivemos especialmente no mercado da música nos últimos anos. Hoje o artista e o próprio consumidor são formadores de conteúdos. As mídias tradicionais (rádio e TV) não detém mais o monopólio de divulgação. Antes, para um artista ser reconhecido pelo público, obrigatoriamente deveria ter suas músicas sendo executadas nas principais rádios do segmento.
Esta primazia não existe mais. Há vários casos de artistas absurdamente reconhecidos pelo grande público que sequer tocam em rádios. As mídias tradicionais foram substituídas pela web e as redes sociais. É fundamental que os artistas entendam esta mudança e que trabalhem corretamente com estas ferramentas.
Guiame: Você também tem alertado artistas para não se tornarem ‘chatos da web’ ou o ‘apelões por streams’ e uma das estratégias para isso foi a espontaneidade na inserção da música no cotidiano do cantor. Como isso poderia ser feito sem que a espontaneidade soasse como amadorismo na divulgação?
Maurício: O importante neste momento é que o artista entenda a importância da continuidade, da frequência. Hoje em dia o desafio para qualquer artista é fazer com que o público consuma sua música diariamente, em diferentes horas do dia. Antigamente o foco das gravadoras era fazer com que o consumidor adquirisse os discos de seus artistas na loja. A partir do momento em que o consumidor adquiria aquele produto, basicamente o trabalho da gravadora extinguia-se ali. Hoje em dia, o trabalho é fazer com que o público ouça as músicas diariamente nas plataformas digitais.
Este trabalho não para nunca! E aí, o artista precisa entender que neste momento precisa estar engajado na divulgação e estímulo de consumo de seus conteúdos. Um trabalho cotidiano, interminável. As formas como ele pode promover este estímulo são as mais variadas. Minha sugestão é para que ele fale sempre de música de diferentes formas. Inserir no seu dia a dia, por exemplo, a caminho da academia ou de algum compromisso, através de uma postagem na rede social é uma estratégia leve e criativa de sempre tratar um tema recorrente, mas de forma agradável. O que importa é que este trabalho seja diário!
Guiame: As plataformas digitais são uma realidade e isso não se pode negar, porém elas ainda não são 100% das plataformas de vendas do mercado fonográfico, muito menos tudo na carreira do artista. Na sua opinião, qual a importância de reconhecer o lugar que que este setor tem ocupado no cenário musical?
Maurício: No nosso caso, Sony Music, as vendas digitais representam 98% de nosso faturamento. No ano passado lançamos mais de 200 projetos no formato digital e apenas 2 no formato físico. Em 2018, pelas projeções teremos 400 a 450 projetos digitais sendo lançados em nossa empresa e, destes, apenas 1 ou 2 terão versões físicas. Não temos mais foco algum em receitas que não sejam essencialmente digitais. O papo de que o mercado gospel é mais atrasado, mais lento nas transformações, sinceramente não é o que estamos vivenciando.
Na verdade, acho que este tipo de discurso atrapalha e muito nosso meio e tem trazido ao longo de décadas uma cultura contrária às inovações. De tanto repetirmos este mantra, deixamos de estar à frente de muitas transformações. Quem se contenta com o atraso é porque deve ter outros interesses não muito claros. A expectativa é de que o mercado fonográfico no Brasil gere um faturamento superior a 1 bilhão de reais, o maior resultado de todos os tempos. A Sony Music, na área gospel teve um crescimento no último ano fiscal de 70% das receitas digitais. Neste momento, é importante reconhecer que vivemos um novo momento da música e de seu consumo. Não entender e não ajustar-se para este novo momento é sintoma de autismo pleno.
Guiame: Atualmente, o investimento de um cantor na divulgação de sua carreira não se restringe mais à exposição de apenas suas próprias músicas, mas sim na exposição de suas playlists, com os artistas que o têm influenciado de alguma forma ou apenas agradado. Na sua opinião, de que forma isto pode influenciar na interatividade dele com os fãs?
Maurício: Cada vez mais a música está no cotidiano das pessoas. Nunca se ouviu e produziu tanta música. Por semana, são lançadas cerca de 20 mil faixas inéditas nas plataformas digitais em todo o mundo. O mundo digital trouxe mudanças sensíveis e entre algumas destas transformações podemos destacar o espírito democrático que abriu espaço para novos nomes, novos estilos, novas sonoridades. Também podemos destacar que neste momento a interação entre o artista e o público é bem maior. O público assumiu uma clara posição de participação e opinião.
Hoje quando um consumidor não curte a música de uma playlist ele simplesmente pula a faixa, o que chamamos de skip ou no caso de uma playlist pessoal, ele elimina a música de sua coleção. Tudo é muito simples, muito interativo. O público é senhor da razão e sabe que assumiu uma posição de destaque neste negócio. Por isso, os artistas precisam estar muito antenados ao público e precisam estar próximos a eles.