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UFPR repudia preconceito, mas por enquanto não investiga manual

UFPR repudia preconceito

Atualizado: Sexta-feira, 30 Março de 2012 as 8:30

O Setor de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) informou por meio de nota, divulgada na tarde desta quinta-feira (29), que “repudia qualquer forma de manifestação com conteúdo discriminatório ou preconceituoso”. A declaração foi publicada no site do curso de direito da faculdade e faz referência a polêmica causada por um "manual de sobrevivência" produzido por um grupo de alunos de direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e distribuído para os calouros da instituição.

O material tem oito páginas e foi publicado pelo Partido Democrático Universitário (PDU) com o título “Como cagar em cima dos humanos”, que faz referência aos pombos que vivem no teto da faculdade da sede de direito. Uma das 12 lições do livro orienta meninas sobre a "obrigação de dar".

O PDU publicou uma nota na internet dizendo que: "o Manual de Sobrevivência do Calouro é, de cabo a rabo, uma piada, que tem o objetivo de mostrar aos calouros que a política acadêmica não é feita apenas de picuinhas e deslealdades".

A nota assinada pelo diretor da Faculdade de Direito da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca, ainda afirma que o setor “defende ainda de modo intransigente a liberdade constitucional de expressão, mas que, eventuais abusos no exercício deste direito, ao adquirirem dimensão institucional, serão objeto de apuração e eventual punição na forma das normas administrativas em vigor”.
Em entrevista do G1, Fonseca disse que a faculdade ainda não recebeu nenhum pedido formal de apuração de responsabilidade do caso. “Mas se vier a ter uma apuração os envolvidos serão responsabilizados”.
Quando questionado se poderia avaliar a situação em questão como jurista, o diretor do Setor de Ciências Jurídicas da universidade afirmou que se o caso vier a ser investigado, provavelmente ele será uma das pessoas envolvidas na apuração, e preferiu evitar qualquer pré-julgamento. “Acho que qualquer apuração tem que ter os dois lados. Mas isso não pode ter um linchamento público prévio”.

Fonseca reafirmou que o curso tem uma posição firme e decidida contra toda a forma de discriminação e preconceito, mas que se deve analisar em que medida a liberdade expressão foi extrapolada. Mas ressaltou que considera “lamentável” a mídia dar espaço a uma discussão sobre “panfletos estudantis de mau gosto” produzidos por estudantes em formação, ao invés de divulgar a “dogmática jurídica” e os serviços prestados pelo curso de direito da UFPR.


Manual
Em partes, o manual mostra aos calouros dicas de "como se dar bem na vida amorosa utilizando a legislação brasileira". As orientações se baseiam em uma das disciplinas do curso de direito: obrigações.

Um dos tópicos diz: “A garota foi com você ao quarto, prometendo mundos e fundos (principalmente fundos), mas o máximo que você conseguiu foi um beijo: Código Civil, art.233- obrigação de dar: 'A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados (...)'”.

Ainda de acordo com o manual, se em alguma situação a garota disser: "Vamos com calma", o aluno deve usar o artigo 252 do Código Civil, que diz: "nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou". A conclusão no manual após estas citações é: "Ela vai ter que dar tudo de uma vez".

Repúdio
O Grupo de Gênero da UFPR publicou uma nota em que aponta que o manual evidencia “a cotidiana opressão machista”. “As ‘piadas’ provocativas, quando colocadas no contexto das relações sociais das quais elas derivam, representam tentativas de legitimação de opressões e violências reais que ocorrem todos os dias contra as mulheres”, diz a nota.

Para a estudante do 3º ano de direito da UFPR e integrante do Grupo de Gênero, Naiane Bittencourt, a publicação deste manual tem impactos muito sérios e “não pode ser levada na brincadeira.”

“Acho que isso deve ser debatido, pois o machismo não está presente só na realidade concreta, está implícito em outras ações. E a gente tem que destruir ele em todos os âmbitos da sociedade para que novas ações como esta não aconteçam”, disse.

Segundo a professora do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), e doutora na área de humanas em estudos de gênero, Karina Janz Woitowicz, a castração dos direitos humanos e a liberdade de expressão nunca podem ser contrapostos. “A liberdade vai até onde houver o respeito ao outro”, afirmou.

“Entendo que a discussão deste manual é importante, pois está ele reproduzindo conceitos machistas que remetem a uma condição violência”.

Para a especialista na questão de gênero, não é um exagero apurar quem são os envolvidos na construção deste manual e responsabilizá-los “por reproduzir preconceitos”.  “Ironizar uma situação como esta é reforçar atitudes machistas. (...) Se você ignora isso está apagando a importância que isso tem no imaginário da pessoa, na reprodução do proconceito, na violência e opressão”, opinou.

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