O pé direito de Andrés Iniesta virou sorvete na Espanha. Em um comercial com pegada meio futurista, um sujeito, ao lado do craque, cria a guloseima em um computador. Quando ele diz ao meia que é preciso esperar duas horas para o experimento ficar pronto, Iniesta retruca: “Não podem ser 116 minutos?”. O criador do sorvete, com um sorriso leve estampado no rosto, como que em tom de gratidão, aceita. Afinal, foi no minuto 116 que Iniesta, há quatro anos, moldou os destinos futebolísticos de dois países ao fazer, na prorrogação, o gol que deu à Espanha o título mundial contra a Holanda – em duelo que se repete agora, às 16h desta sexta-feira, na Arena Fonte Nova, em Salvador, como se fosse um minuto 117 simbólico, o estalo posterior àquele instante que entrou para a eternidade. E é justamente a estreia das duas equipes no Mundial.
Foi a terceira final da Holanda na história das Copas. E seu terceiro vice. Aquilo machucou o time laranja, sobretudo seu maior astro, Arjen Robben, que teve diante de si a melhor chance do jogo, seu momento supremo – o chute parou no goleiro Casillas. Agora, Robben estará novamente em campo, assim como estará Sneijder, assim como estará Van Persie. E assim como estarão as lembranças daquela derrota.
- Penso muito nisso. Dói perder uma chance dessas – disse o atacante.
Dicotomias do futebol: a dor de Robben é a alegria de Iniesta. Depois daquele gol, o meia do Barcelona se tornou ainda mais reverenciado. A ponto de ser aplaudido mesmo no Brasil, onde a Espanha foi tão vaiada ano passado, na Copa das Confederações. Voltar ao Brasil, agora para a Copa do Mundo, é um sonho para o craque espanhol.
- Pessoalmente, vivo um momento muito especial. Não imaginava tudo isso. As pessoas me aplaudiam durante a partida, depois de fazer uma jogada. A sensação é bonita, é especial. As pessoas mostram um respeito e um carinho muito grandes por mim – afirmou o jogador em entrevista exclusiva à TV Globo.
Iniesta quer aproveitar a Copa. Espera que seja um evento a ser curtido pelo povo. E diz que entende a onda de manifestações que marcou a preparação do país para o Mundial.
- É difícil entender o que acontece, mas quando muita gente de um país se manifesta dessa forma, deve ter uma razão real. Para nós, ir jogar um Mundial no Brasil é algo único e maravilhoso. Espero que seja o que todos queremos que seja. (...) Desejo que a Copa do Mundo seja um acontecimento único, histórico, e que as pessoas possam aproveitar. E que a Espanha possa chegar longe.
Para a Espanha chegar longe, ela vai precisar do próprio Iniesta. A derrota de 3 a 0 para o Brasil na Copa das Confederações expôs falhas de um time que demora a se renovar. A mecânica é a mesma de quatro anos atrás, funcionando de acordo com a movimentação e a capacidade de controle de bola dos jogadores do meio-campo – peças como Xavi, Xabi Alonso, Fàbregas, David Silva e, claro, o próprio Iniesta. A novidade pode estar no ataque: Diego Costa concorre à vaga de centroavante com Fernando Torres.
Na Holanda, a renovação está na defesa. Louis van Gaal agora aposta em um ferrolho para dar solidez ao time. Ensaiou um sistema com cinco defensores e deve apostar nisso contra a Espanha. E sem nenhum dos atletas que estavam na retaguarda na final de 2010 (figuras como o goleiro Stekelenburg, o lateral-direito Van der Wiel, os zagueiros Heitinga e Mathijsen e o lateral-esquerdo Van Bronckhorst). O setor é repleto de novidades: Cillessen, Janmaat, Vlaar, De Vrij, Indi e Blind.
- A Holanda, em quatro anos, mudou muito. Foram 16 trocas e sete permanências. E nós, mais ou menos o contrário. Temos uma seleção estável, que dura desde 2010. A Holanda é comandada por um homem pelo qual tenho muita estima por sua passagem pela Espanha. Ele conserva muitas coisas da essência do futebol holandês, jogadores muito habilidosos – comentou o técnico da Espanha, Vicente del Bosque.
O trunfo da Holanda é ofensivo. A permanência dos craques Sneijder, Robben e Van Persie dá esperanças de bons resultados à equipe laranja. Juntos, eles somam 92 gols pela seleção. E terão que desafiar uma defesa que sofreu apenas seis gols no somatório dos títulos das Eurocopas de 2008 e 2012 e da Copa de 2010.