Os deputados integrantes da chamada “CPI do Trabalho Escravo” da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovaram nesta quarta-feira (07) a convocação do representante da empresa espanhola Zara para prestar depoimento sobre denúncias de envolvimento da marca em práticas de trabalho análogos à escravidão em São Paulo.
Entre os convocados estão o empresário Enrique Huerta Gonzales, ex-diretor de comunicação da marca Zara no Brasil, e Jesus Echevaria, diretor global da Inditex, empresa espanhola detentora da grife.
O requerimento aprovado pela CPI paulista chama o executivo da empresa em solo em caráter convocatório, sem possibilidade de recusa.
"As denúncias contra a Zara deram origem ao pedido desta CPI, em 2011. Agora, tanto o Ministério Público do Trabalho quanto o Ministério Público Federal deram passos importantes na responsabilização criminal e trabalhista. A Zara já veio à Comissão de Direitos Humanos e tentou se esquivar da responsabilidade mas, meses depois, foi flagrada no mesmo esquema de trabalho escravo de bolivianos na Argentina. Queremos saber se houve mudança num esquema global de exploração de pessoas ou se a empresa se esforça só para fugir da responsabilidade e da lista suja do trabalho escravo.", diz o presidente da CPI, deputado Carlos Bezerra Jr (PSDB), autor dos requerimentos.
Além dos executivos da Zara, os donos das duas empresas prestadoras de serviço para a grife espanhola também serão convocados pela comissão parlamentar. Rosângela Theodoro, Sandra Aparecida Campanholo e Silvia Regina Fernandes são sócias da Rhodes Confecções, a empresa detentora do contrato com a Zara que terceirizou o trabalho para a empresa do também boliviano Narciso Atahuichy Choque, que empregava os imigrantes em condições de precariedade.
Os quatro foram denunciados pelo Ministério Público Federal na semana passada por empregarem 51 trabalhadores bolivianos numa oficina clandestina na cidade de Americana, interior de São Paulo.
O caso foi descoberto durante operação do Ministério do Trabalho e Emprego entre maio e agosto de 2011 e motivou a abertura da CPI na Alesp.
Segundo o MPF, os trabalhadores estrangeiros trabalhavam em jornadas de 14 horas por dia, sem direitos trabalhistas e horário de descanso e alimentação entre as jornadas.
Na época da descoberta do escândalo, a Zara disse que não tinha conhecimento da prática nas oficinas que trabalhavam para a marca no País. Os espanhóis afirmaram que o trabalho da Rhodes Confecções não era exclusivo da empresa e que a empresa terceirizou o serviço para o empresário boliviano sem informar a companhia, descumprindo o código de ética da empresa.
Para corrigir o mau ententido, a Zara descredenciou a Rhodes Confecções, cancelando o contrato de serviços com a empresa.
A marca também orientou todos os outros 31 prestadores de serviço no Brasil a respeitarem as leis trabalhistas e aperfeiçoou a fiscalização nos fornecedores e prestadores de serviço.
Os espanhóis também assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT) se comprometendo a investir R$3,4 milhões em ações de amparo e ajuda aos imigrantes no Brasil.
Para evitar novas denúncias que resvalem na grife, a empresa espanhola também criou uma linha 0800 770 9242 para receber denúncias de práticas de escravidão na linha de produção de roupas.
Apesar das ações, o presidente da CPI da Alesp argumenta que ainda há necessidade de ouvir a marca:
"Na época do primeiro depoimento, os representantes da Zara negaram e fugiram o tempo todo das perguntas. Contudo, meses depois de descoberto o caso de Americana, outra denúncia de uso de trabalho escravo por eles na Argentina veio à público. A comissão quer saber se isso é uma prática global da corporação e que medidas efetivas estão sendo tomadas para evitar esse tipo de prática, que também já foi denuncia na China e em outros sete países", afirma Carlos Bezerra, presidente da CPI da Alesp.
Mesmo com Enrique Huerta Gonzales já ter deixado a empresa, os membros da CPI resolveram convocá-lo por entender que ele sabia de todo o processo naquela época. Nos bastidores, um dos membros acreditam que agora fora da empresa, Gonzales possa dar detalhes internos de contratação de fornecedores da companhia.
O depoimento dos dois representantes da Zara à época está marcado para o dia 21 de maio pela CPI. A Zara lembra que nunca fora processada na Justiça brasileira e que não tomou conhecimento desses casos internacionais de denúncia em outros países.