Rir é um dos grandes prazeres da vida. O brasileiro, povo forjado na mistura de raças e culturas, tem no humor uma de suas características mais marcantes. Temos a saudável capacidade de não nos levarmos a sério demais, sabemos sorrir apesar dos pesares, apesar das desilusões tão bem cantadas por Chico Buarque, ?apesar de você amanhã há de ser outro dia?. A vida continua e perder o bom humor é como perder a alegria da vida.
Mas o humor, com uma ponta de pena constato, virou um negócio e perdeu sua espontaneidade ingênua, aquela da graça que só queria fazer rir e nada mais. Foi-se o tempo das boas comédias, dos bons humoristas e humorísticos. Alguns programas dos canais abertos e fechados são classificados como sendo de humor, enquanto, na verdade, são um repetitivo desfile de obviedades, obscenidades e apelações com piadas cheias de trocadilhos dúbios e palavras chulas acompanhadas de expressões idem.
Quando lançado, assisti e gostei do CQC da Band. Os meninos estavam trazendo uma boa lufada de ar para um segmento tão decadente da TV. A proposta era de um humor ácido, provocativo e inteligente. O tempo passou, e olha que foi pouco tempo, e o conteúdo foi baixando de nível. Se por falta de criatividade ou assunto, não sei, mas que baixou o nível, baixou. Todas as matérias, ou quase, na ânsia de ganharem um ângulo engraçadinho, acabam por descambar para frases e expressões com duplo sentido, depreciativas e, as vezes, até ofensivas. As pautas do programa não querem nem saber se tem um monte de crianças assistindo, e tem. Vale tudo, eventos eróticos, filme pornô, não interessa, se der audiência o CQC está lá e, sem o menor constrangimento, tudo é despejado no tapete das nossas casas.
Nessa hora precisamos escolher, varre-se tudo para debaixo do tapete ou varre-se para o lixo e do lixo para o lixão? Cada um administra os cardápios da sua casa como quer, é problema e decisão íntimos, ponto. Em casa, há bons meses nos cansamos, esse humor de fim de feira não entra. E em fim de feira, você sabe, tudo é mais barato e já não tão fresquinho. Sem falar no período depois da feira, quando muitas sobras são recolhidas por andarilhos. Lógico, o fim de feira ainda tem méritos e utilidades práticas para aqueles que precisam. Mas humor a qualquer preço não tem a menor graça, chega.
A parte chata de toda essa oferta de humor é que, por se tratar apenas de piada, uma grande maioria sai falando, repetindo e rindo de assuntos que, sinceramente, não deveríamos estar rindo ou debochando. Deveríamos estar preocupados, pensando, chorando. Sem se dar conta acaba-se por tripudiar em cima da opção alheia, das preferências, dos jeitos. Vide a infeliz colocação do ator Robin Williams, alegando que a vitória do Brasil para sediar as Olimpíadas deveu-se a um punhado de mulheres sensuais e uns gramas de cocaína, ou seja, o que para ele foi piada, para nós foi ofensa. No humor a qualquer preço acaba-se por julgar e condenar com gargalhadas pessoas que nem imaginam serem alvos de algo. Enfim, no rolo compressor do humor sem limites termina-se por ridicularizar a tudo e a todos, até Deus.
Falar que esse cenário é obra do capeta seria muito simplista, ele, na real, deve estar é rindo muito com os descaminhos do produto humor. O inferno sabe que o humor é uma arma poderosa para o evangelho. É aqui que sua atenção deve focar. A decadência no humor não deve fazer a igreja desistir desta virtude. Existem ministérios fantásticos no Brasil pregando o evangelho através de um bom, saudável, contestador e inteligente humor. Exemplos? Palhaço Paulinho, Jasiel Botelho, Maurão e seus bonecos, dentre tantos outros. Isto sem falar nos pregadores fiéis a uma rigorosa exegese, uma bem aplicada homilética, uma profunda teologia bíblica, uma ótima visão contemporânea e contextualizada e que não dispensam o ingrediente do humor, bem temperado, equilibrado e assertivamente aplicado.
Desde os tempos bíblicos, sorrir continua sendo um ótimo remédio. A Bíblia está recheada de bom humor, respostas inteligentes, ironia refinada, cenas engraçadas pelas situações inusitadas e risos de vários tipos em circunstâncias diferentes e improváveis. No Salmo 2, o salmista afirma nos três primeiros versos que grande parte dos habitantes da terra se rebela fazendo questão de registrar sua insatisfação contra o Senhor e o seu ungido e, no verso quatro o poeta revela a reação do próprio Deus, o criador do sorriso: Aquele que habita nos céus se rirá; o Senhor zombará deles.
Se Deus se reserva o direito de manter a calma, o controle e sorrir perante seus opositores, penso que devemos aprender com Ele. O humor saudável, que considera e respeita adultos e crianças, deve ter prioridade sobre a possibilidade de uma vida sisuda, sem riso e chata. A alegria é nosso destino eterno. Enquanto aqui, neste cenário de tantas e inexplicáveis lágrimas, vale o conselho do Salmo dois no verso onze: Servi ao Senhor com temor, e alegrai-vos com tremor.
Paz!
Pr. Edmilson Mendes
Edmilson Ferreira Mendes é teólogo. Atua profissionalmente há mais de 20 anos na área de Propaganda e Marketing. Voluntariamente, exerce o pastorado há mais de dez anos. Além de conferencista e preletor em vários eventos, também é escritor, autor de quatro livros: '"Adolescência Virtual", "Por que esta geração não acorda?", "Caminhos" e "Aliança".
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