O ensino domiciliar no Brasil ainda carece de regulamentação, e para isso está em discussão no Senado Federal o Projeto de Lei n° 1338, de 2022, que trata deste assunto e pretende especificar as normas para que os filhos tenham a opção de receber o currículo escolar em suas próprias casas, através dos pais e não da escola.
Apesar disso, a prática do homeschooling há anos já é uma realidade no Brasil, com ao menos 34 mil famílias tendo o adotado, o que resulta em um número de 70 mil estudantes entre 14 e 17 anos sendo conduzidos por esse modelo, segundo a Associação Nacional de Educação Domiciliar (ANED).
Essas famílias se baseiam, por exemplo, no artigo 26.3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário. Ela afirma que “os pais têm prioridade de direito na escolha do tipo de educação a ser ministrada a seus filhos”.
Mas, mesmo com o Governo Brasileiro tendo assinado essa Declaração, uma mãe de Santa Catarina chamada Regiane Cichelero foi multada em R$1.500 diários enquanto não matricular seu filho de 12 anos em uma escola regular. Além disso, ela está tendo a guarda da criança ameaçada por parte do juizado local.
Tudo porque, Regiane resolveu manter o ensino domiciliar do seu filho, o que ela iniciou durante a pandemia da COVID-19, quando as escolas foram fechadas. Ora, é óbvio que não estou endossando negligência alguma sobre os cuidados da criança no tocante à educação escolar.
Partimos, aqui, do pressuposto de que essa mãe tem a competência necessária para ensinar o seu filho, não deixando em nada a desejar, como todos os pais que optam por esse modelo de ensino devem ter e vêm se apresentando ao longo dos anos.
Não por acaso, segundo a ANED, "até hoje, no Brasil, das centenas de famílias processadas pela prática da educação domiciliar – havendo trânsito em julgado ou não –, nenhuma foi condenada por abandono intelectual, pois a justiça não encontrou evidências a esse respeito."
Ou seja, os pais que optam pelo ensino domiciliar têm consciência da responsabilidade que precisam ter diante da formação dos filhos, não sendo pessoas negligentes, mas sim preocupadas em dar um tipo de educação melhor, mais segura e personalizada.
Ataque explícito
Não precisamos nos esforçar muito para saber a opinião da maioria dos brasileiros sobre a qualidade da educação escolar em nosso país. Isto posto, é mais do que compreensível a escolha de milhares de famílias pelo ensino domiciliar.
A decisão contra Regiane, que certamente se mostra uma mãe dedicada, é um estupro contra o princípio da proporcionalidade jurídica ao ameaçar retirar a guarda do seu filho, assim como a multa diária, que não passa de uma ferramenta abusiva de força.
Particularmente, entendo que o correto, nesses casos, é que uma avaliação de competência mínima seja efetuada, desde que de forma honesta, justa e proporcional à realidade de cada família, levando-se em consideração a prioridade dos pais sobre o modelo de educação, conforme o já citado artigo 26.3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Qualquer coisa além disso, no meu entender, constitui um ataque explícito à autoridade dos pais sobre os filhos, algo que devemos repudiar e lutar para que não se torne normal em nosso país - ao menos enquanto ainda respiramos como uma Nação livre e democrática!
Marisa Lobo é psicóloga, especialista em Direitos Humanos, presidente do movimento Pró-Mulher e autora dos livros "Por que as pessoas Mentem?", "A Ideologia de Gênero na Educação" e "Famílias em Perigo".
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