“Aproveite sua liberdade para falar de Jesus”, diz cristã norte-coreana em visita ao Brasil

Em entrevista ao Guiame, Kim Sang-Hwa contou como ela e sua família sobreviveram ao regime comunista.

fonte: Guiame, Luana Noaves e Cássia Kieffer

Atualizado: Quinta-feira, 20 Fevereiro de 2025 as 4:20

Imagem ilustrativa. (Foto: Portas Abertas).
Imagem ilustrativa. (Foto: Portas Abertas).

Há décadas, a Coreia do Norte é o país mais fechado para o Evangelho do mundo, proibindo igrejas, Bíblias e evangelismo.

No país, que ocupa o 1° lugar da Lista Mundial da Perseguição 2025 da Missão Portas Abertas, se uma pessoa que se converteu ao cristianismo for descoberta, enfrenta prisão, tortura, trabalho forçado em campos de prisioneiros e até a morte. O cristão é considerado um criminoso e as punições atingem toda sua família, até a terceira geração.

Avivamento na Coreia do Norte

Mas nem sempre foi assim. Antes da separação do país em Coreia do Norte e Coreia do Sul – ao final da Guerra da Coreia na década de 1950 – havia cerca de 500 mil cristãos na região que hoje é a Coreia do Norte.

Antes mesmo dos primeiros missionários protestantes chegarem na área em 1886, já havia uma pequena comunidade de cristãos. 

Em 1907, um grande avivamento marcou a história da nação, com a capital Pyongyang sendo chamada de a “Jerusalém do Oriente”. Centenas de igrejas surgiram, várias reuniões de avivamento foram realizadas e instituições de ensino cristãs foram criadas.

Os pais e avós de Kim Sang-Hwa (pseudônimo), uma cristã norte-coreana, viveram nessa época e desfrutaram da liberdade religiosa na região.

Em entrevista ao Guiame, a desertora contou o testemunho de fé de sua família. “Eu sou a terceira geração de cristãos na minha família, pois meu pai e meus avós se converteram antes da Guerra da Coreia entre 1950 e 1953. Porém, eu já nasci em um contexto de extremo controle do governo sobre todo cidadão norte-coreano e, principalmente, sobre o cristão que é visto como traidor do sistema, do governo e do país”, contou ela.

Mesmo nascendo em uma família cristã, Kim não sabia que seus pais eram convertidos e nunca havia ouvido sobre Jesus em casa. No país, os pais mantêm a fé escondida dos filhos, porque as crianças são incentivadas a denunciar os pais na escola.

“As crianças norte-coreanas são estimuladas a entregar seus pais, caso encontrem uma Bíblia (livro preto) em casa ou encontrem seus pais em atitudes suspeitas”, explicou Sang-Hwa.

Descobrindo que seus pais eram cristãos


A Coreia do Norte tem vários campos de trabalho forçado, onde cristãos são enviados. (Foto: Portas Abertas).

Até que aos 9 anos, ela descobriu a crença da família. “Um dia, vasculhando uma gaveta de uma mesa de escritório, vi que essa mesa tinha um fundo falso. Enfiei a mão e senti um papel diferente e achei que fosse dinheiro. Ao puxar, veio um livro preto sem inscrição alguma na capa. Abri e li: ‘No princípio criou Deus os céus e a terra’. Fechei rapidamente e entendi que aquele era o livro preto. Tremi, chorei, fiquei confusa. Não sabia o que fazer: entregar meu pai para a professora, perguntar a ele sobre o livro proibido”, lembrou Kim.

Mesmo com medo, Kim decidiu perguntar ao pai e ele lhe apresentou o Evangelho pela primeira vez.

“Ele me mostrou o céu, estrelas, a terra e a grama sobre nossos pés e disse que tudo o que há, inclusive os seres humanos, foram criados por Deus. Eu, como toda a população norte-coreana não sabia o que era criar, o que era criação. E de repente, eu estava me deparando com um Deus, um ser superior a Kim Jong Il e Kim Jong Un, que tinha criado tudo o que existia”, relatou.

A menina aceitou Jesus e iniciou uma jornada com Deus. “Foi assim, perguntando ao meu pai incessantemente e lendo a Bíblia, que fui crescendo em graça e verdade”, testemunhou Kim.

A norte-coreana foi transformada em sua identidade depois de conhecer o Evangelho. “Quem conhece a Deus tem a sua identidade devolvida”, ressaltou. 

“Na Coreia do Norte, o cidadão não se reconhece como cidadão. Tudo o que ele tem e é, pertence ao Estado. E ele acha isso normal, pois é a sua única referência. Quando conhecemos Jesus absolutamente tudo muda. Nós temos um Deus com quem conversar e sabemos que somos ouvidos. Nós não somos mais cidadãos de um país que não se relaciona. Mas somos cidadãos do Reino dos Céus e temos uma identidade como filhos amados de Deus”, refletiu.

Vigiados por agente secreto


Os norte-coreanos são obrigados a adorar somente o ditador Kim Jong Un. (Foto: Portas Abertas).

Kim ainda revelou que sua família viveu a fé em secreto, assim como todo o restante dos cristãos no país.

“A igreja na Coreia do Norte é secreta. Os negócios de família (comércios e serviços) são utilizados para encontros de cristãos e para evangelismo. Mas isso também é muito perigoso e, sempre que descoberto, os cristãos são mortos ou enviados para campos de trabalhos forçados”, explicou ela.

“O evangelismo é feito no corpo a corpo. Começando por nossos filhos, de forma bem restrita, com restrição de palavras e orações e até a forma de falar, pois estamos passíveis de sermos delatados por nossos filhos, esposos e esposas”.

A norte-coreana disse que seu pai evangelizou um vizinho durante 30 anos, mesmo enfrentando riscos. Quando este homem estava no leito de morte, revelou que era um agente secreto do regime comunista.

“Na cama, para morrer, ele chamou meu pai, que foi orar por ele. O homem revelou que foi designado para investigar a nossa família. Ele sabia que éramos cristãos e por 30 anos não nos delatou”, contou.

Durante décadas, a família de Kim foi protegida por Deus. “A graça de Deus é abundante sobre a Igreja Perseguida na Coreia do Norte. Não tememos a morte”, testemunhou Sang-Hwa.

“Ainda criança, quando eu evangelizava um coleguinha, tinha certeza de que, se fosse morta por isso, estaria com Jesus na mesma hora e que poderia levar aquele colega a conhecer a Cristo. Isso era motivador para mim”, destacou.

Na vida adulta, Kim fugiu para a China com seu esposo, também cristão, e seu filho. O casal temia que um dia sua fé fosse descoberta. 

“Conhecemos muitos cristãos norte-coreanos refugiados na China e fizemos um grupo de adoração e ensino bíblico e isso fez com que fôssemos fortemente monitorados e perseguidos", disse. 

“Em alguns anos, resolvemos sair também da China e ir para um país livre de perseguição a cristãos, que foi a Coreia do Sul, onde estamos até hoje e nossos outros filhos nasceram”, acrescentou.

Liberdade religiosa no Brasil

Em viagem ao Brasil com a Missão Portas Abertas, Kim conheceu de perto a liberdade religiosa que as igrejas brasileiras desfrutam.

“Eu só tenho a dizer o quanto vocês podem adorar livremente a Deus. O quanto vocês podem evangelizar livremente. O quanto isso é possível e até estimulado no Brasil”, afirmou.

“Por favor, aproveitem a liberdade que vocês têm para adorar a Deus, buscar a Deus, ter comunhão um com os outros e, principalmente, para falar de Jesus. O fim está próximo e a perseguição global é uma realidade. Aproveitem a liberdade religiosa que vocês têm”, encorajou ela.

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