"Conta as bênçãos, conta quantas são, recebidas da divina mão, uma a uma, dize-as de uma vez, e há de ver surpreso quanto Deus já fez!" Estas palavras fazem parte de um dos grandes hinos da tradição protestante, sua música pontuou milhares de cultos por todo Brasil em cerimônias de ações de graças, adoração e lágrimas. No caso específico deste hino, sua poesia nos desafia a percebermos e reconhecermos as bênçãos de Deus em todas as circunstâncias da vida. Isso fica transparente na estrofe que diz: "Seja teu conflito fraco ou forte cá, não te desanimes Deus por cima está, seu divino auxílio minorando o mal, te dará consolo sempre até o final."
O que mais me atrai nesta música é o ensino transmitido. Se eu olhar para o dia a dia da minha vida com a perspectiva que Deus olha, o comum passa a ser incomum. Quem me inspira este pensamento é o autor, pois ele afirma que se eu começar a contar, atentamente, cada uma das bênçãos de Deus, ficarei surpreso! Ora, como posso ficar surpreso por bênçãos de Deus? Não as notei? Foram derramadas sobre mim e nem percebi? Os céus enviavam bênçãos e eu, insensível, achava tudo comum? Refletindo sobre as respostas para estas perguntas acabei por ficar exatamente como o hino diz: surpreso.
Corri para o evangelho. É surpreendente como Jesus torna o comum em algo incomum. Seus milagres surgem de necessidades reais, via de regra são carregados de lições e ensinamentos. Suas mensagens são extraídas da vida comum para ganhar profundidade incomum. Qualquer um do povo, letrado ou não, podia ser agraciado com a compreensão daquilo que Jesus falava e fazia, afinal, é do agrado de Deus revelar-se a pequeninos, pobres, rejeitados, abandonados, perseguidos, injustiçados, injuriados, enfim, gente comum que recebe de Cristo uma transformação incomum.
Este agir de Deus segue-se inclusive depois da ressurreição. Quando se esperava feitos espetaculares, como espetacular foi sua vitória frente à morte, Ele continuou insistindo em manifestar-se de um jeito comum. Nos primeiros catorze versículos do último capítulo do evangelho de João, temos a narrativa da terceira aparição de Jesus. Ainda com dificuldades para assimilar a ausência de Cristo e tudo que havia acontecido, Pedro decide: "Vou pescar". Seis discípulos ouvem e decidem ir junto. Os sete passam a noite toda remando, lançando e puxando rede. Remando, lançando e puxando rede. E nada. Nenhum peixe para contar a história. Comum! Diriam os pescadores que povoam nossas igrejas, de tão acostumados que estão a irem pescar, de vez em quando, e não pegarem nada! E é desta situação comum que Jesus resolve fazer o incomum.
Já é madrugada. Da margem Jesus pergunta aqueles pescadores: "Pegaram algo? Tem alguma coisa para comer?" A resposta é seca, simplesmente um frio e direto "não". Quando as coisas não vão bem, não gostamos de falar e explicar muito, economizamos nas palavras. Percebendo que diálogo não era exatamente o que aqueles homens queriam, Jesus dá uma ordem: "Lancem a rede para o lado direito do barco e vocês pegarão peixes". Da ordem de Jesus para a ação dos discípulos a Bíblia nada registra, apenas nos informa que eles lançaram a rede e fizeram uma pesca fantástica, cento e cinquenta e três grandes peixes! Imediatamente um dos discípulos reconheceu a Cristo, olhou para Pedro e disse: "É o Senhor." Pedro vestiu apressadamente sua túnica, mergulhou e nadou ao encontro do seu Mestre. Lá encontrou peixe na brasa, pão e uma fogueira. Logo os outros chegaram arrastando a rede. Ninguém perguntava nada, porém tinham certeza, era o Senhor!
Observe, é tudo comum. Pescadores pescaram. Fogueira que aquecia quem estava perto. Fogo que assava o peixe. Rústico café da manhã entre pescadores pobres da Galiléia. Olhe bem para a cena, ela é comum. Olhe de novo, veja o homem que deu a ordem e preparou o café da manhã, é Ele quem torna incomum aquilo que é comum. Nada mais comum para um pescador do que pescar peixe! Mas naquela madrugada os sete perderam as palavras! Ficaram mudos de admiração! Fogueira, pão e peixe frito também eram comum para eles, mas em silêncio tinham seus corações saciados e aquecidos pela gloriosa presença comum do único Deus ressurreto e incomum. Lançar a rede era comum, mas lançar a rede sob a palavra de Cristo se tornou uma ação com um resultado incomum. Em outras palavras, Jesus ordenou, eles obedeceram. Foi a partir da obediência que o comum se mostrou como incomum.
A história continua a se repetir. Médico, professor, cientista, pintor, músico, office-boy, zelador, ascensorista, cabeleireiro, policial, enfim, em todas as áreas, profissionais vivem práticas comuns diariamente, até o dia em que fracassam e ouvem a voz de Cristo perguntando sobre recursos, soluções, resultados, e a resposta negativa é dada. Então Ele dá uma ordem e obedecer ou não passa a ser a decisão, pois experimentar o incomum requer obediência, fé e relacionamento. Acredite, Jesus continua surpreendendo. O versículo catorze faz questão de frisar: "Esta era a terceira vez que Jesus se manifestava aos seus discípulos, depois de ter ressuscitado dos mortos." Prestou atenção? Era a "terceira vez". O texto não diz que aquela foi a "última vez", foi tão somente a terceira. Em dois mil anos Ele continuou e continuará se manifestando para os seus discípulos, transformando o nosso comum em algo incomum, fato que, dada a presença real dEle, torna-se maravilhosamente comum para aqueles que creem.
Paz!
Edmilson Ferreira Mendes é teólogo. Atua profissionalmente há mais de 20 anos na área de Propaganda e Marketing. Voluntariamente, exerce o pastorado há mais de dez anos. Além de conferencista e preletor em vários eventos, também é escritor, autor de quatro livros: '"Adolescência Virtual", "Por que esta geração não acorda?", "Caminhos" e "Aliança".
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