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Capital da Coreia do Norte já foi chamada de “Jerusalém do Oriente”

O fim do cristianismo em Pyongyang se transformou em isolamento totalitário.

fonte: Guiame, Adriana Bernardo

Atualizado: Quarta-feira, 27 Agosto de 2025 as 3:08

A Praça Kim Il-Sung, hoje palco de desfiles militares, antes abrigava casas de missionários e eventos religiosos. (Foto: Wikipedia)
A Praça Kim Il-Sung, hoje palco de desfiles militares, antes abrigava casas de missionários e eventos religiosos. (Foto: Wikipedia)

Antes de se tornar o símbolo de um dos regimes mais fechados do mundo, a capital da Coreia do Norte, Pyongyang, foi conhecida como a “Jerusalém do Oriente” – um centro vibrante do cristianismo asiático, palco de avivamentos espirituais e lar de instituições missionárias que marcaram a história da fé na península coreana.

Um solo fértil para o Evangelho

No final do século XIX, missionários presbiterianos e metodistas dos Estados Unidos, Canadá e Austrália receberam autorização do rei da dinastia Joseon para evangelizar a região. Pyongyang rapidamente se destacou como epicentro da fé cristã, com escolas, hospitais e igrejas florescendo em meio à população local.

Em 1901, o missionário Samuel Moffett fundou o Seminário Teológico Presbiteriano de Pyongyang, que formaria os primeiros pastores coreanos. Em 1907, o famoso "Avivamento de Pyongyang" reuniu centenas de fiéis em arrependimento público e oração fervorosa, impulsionando um crescimento exponencial da igreja coreana.

Naquela época, dois terços dos cristãos coreanos viviam no norte do país. Pyongyang era chamada de “Jerusalém do Oriente” por sua densidade de igrejas e pelo fervor espiritual que a caracterizava.

A ruptura: guerra e repressão

Com a ocupação japonesa (1910–1945) e, posteriormente, a Guerra da Coreia (1950–1953), a realidade mudou drasticamente. O regime comunista liderado por Kim Il-Sung assumiu o poder no Norte e iniciou uma repressão sistemática à religião. Igrejas foram fechadas, missionários expulsos, e a fé cristã passou a ser considerada uma ameaça ao Estado.

A narrativa oficial foi reescrita: Kim Il-Sung se tornou objeto de culto, e a história cristã da cidade foi apagada dos livros. A Praça Kim Il-Sung, hoje palco de desfiles militares, antes abrigava casas de missionários e eventos religiosos.

Do ideal à negação

Em 2024, Kim Jong-un anunciou o abandono oficial da ideia de reunificação com a Coreia do Sul, rompendo com um ideal que, por décadas, foi considerado sagrado pelo regime. O Arco da Reunificação, construído em Pyongyang em 2001, foi demolido, e o termo “reunificação” foi removido de livros e estações de metrô.

A cidade que outrora simbolizava esperança espiritual e unidade agora representa isolamento, censura e culto à personalidade.

Totalitarismo em prática

Apesar de algumas alegações contrárias, há consenso entre especialistas e organizações internacionais de que a Coreia do Norte é um regime totalitário. As evidências são contundentes:

- Partido único: O Partido dos Trabalhadores da Coreia domina todas as esferas da vida pública.

- Culto à personalidade: A dinastia Kim é reverenciada com fervor quase religioso, desde a infância.

- Controle absoluto da mídia: Não há imprensa livre; toda comunicação é estatal e voltada à propaganda.

- Repressão sistemática: Campos de trabalho forçado, punição coletiva, tortura e execuções públicas são documentados.

- Supressão da religião: A fé cristã é severamente perseguida, com relatos de prisões e mortes por motivos religiosos.

- Isolamento e doutrinação: A população vive sob vigilância constante, sem acesso à internet ou informações externas.

Em 2024, Kim Jong-un anunciou o abandono oficial da ideia de reunificação com a Coreia do Sul. O Arco da Reunificação foi demolido, e o termo “reunificação” removido de livros e estações de metrô — um gesto simbólico que reforça o isolamento ideológico do regime.

Vestígios e esperança

Apesar da repressão, há sinais discretos de fé sobrevivente. Igrejas como a Changchung Cathedral (católica) e a Igreja Ortodoxa da Trindade Vivificante funcionam sob rígido controle estatal, com presença limitada de clero estrangeiro. Em 1992, o evangelista Billy Graham visitou Pyongyang, reacendendo brevemente a memória de sua antiga identidade espiritual.

Hoje, organizações cristãs ao redor do mundo continuam a orar e agir em favor da Coreia do Norte, lembrando que a “Jerusalém do Oriente” pode ter sido silenciada, mas não esquecida.

 

Adriana Bernardo (@adrianammbernardo) é jornalista, escritora e idealizadora do grupo feminino cristão “Amigas de Deus”. Professora de Teologia e Aconselhamento. Casada com Bene Bernardo, é mãe de Raphael, Aline e Guilherme, e avó de Raquel, Daniel e Júlia.

* O conteúdo do texto acima é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

Leia o artigo anterior: Por que denúncias de cristãos sobre abusos infantis, como as de Felca, foram ignoradas?

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